sábado, 17 de abril de 2010

Dona Represa



Democracia Representativa, ou Dona Represa, é provavelmente a personagem mais triste da família institucional. Prioriza sempre os outros antes de si e é uma tentativa de retratar a condição de muitas mulheres da cultura ocidental pós-revolução feminista, que ou abrem mão de constituir uma família, ou acumulam papéis de tradicional mulher submissa ao casamento e às estruturas familiares, e moderna profissinal independente, não de maneira integrada, mas sim na forma de conflito, onde o comportamento é um, mas muitas vezes a vontade é outra.
No que tange à dimensão privada, esse tipo de vida da Represa, quando encarado de forma pendular, é sempre um potencial curto-circuito, principalmente do ponto de vista emocional. Em alguns casos, essas mulheres se tornam autoritárias, mas isso não acontece com a Represa. Ela tem a garganta e o coração aprisionados, como mostra a roupa que usa, representando uma jaula de ferro de instituições racionais-legais.

Essa personagem também retrata uma obsessão com imagem e aparência, tão presentes na cultura urbana de vários países tocados pela cultura ocidental, e tão típica da representação política ancorada na mídia dos dias de hoje. Não que a beleza exterior do corpo e dos ambientes não deva ser cultivada dentro dos limites da razoabilidade, mas Dona Represa representa a possibilidade de se tornar uma mulher com "beleza inabitada", a tristeza de ser mulher e sentir-se vazia por não ter tempo de cuidar de seu mundo interno ao viver em função da aparência, das demandas de 4 filhos e de um marido exigente, em uma cultura que prioriza a independência de indivíduos no mercado de trabalho e que muitas vezes tende ignorar o mundo interno das pessoas, substituindo-o por Prozac e Rivotril.

Por ser obrigada a gerenciar a convivência de muitas pessoas ao mesmo tempo, mantendo-se firme, Represa às vezes se sente um veículo em função das intenções dos outros, e constantemente seu corpo treme e seus cabelos se arrepiam, sinalizando que está prestes a explodir, embora seus valores, no fundo, não sejam selvagens, livres ou revolucionários, e sim bastante assépticos, ordenados e conservadores.

OBS: Quando comecei a desenhar a Dona Represa, eu estava impressionada com as personagens femininas no filme The Stepford Wives, filmado em 1975, e posteriormente em 2004.

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